Caminho da Lua : Arcano XVIII do Tarot de Crowley
Atravessando o Oceano do Desconhecido
Na minha opinião, este é um dos caminhos mais desafiadores. O caminho da Lua é regido pelo signo de Peixes, oposto complementar ao racional e lógico signo de Virgem. Tanto a Lua quanto o signo de Peixes têm uma coisa em comum: astrologicamente, simbolizam emoções, psique, afinidades metafísicas e subjetivas. Peixes vai além do mundo imanente e está relacionado ao inconsciente coletivo, esta vastidão onde, segundo C.G. Jung, encontramos todos os arquétipos puros. O contato de Peixes com a dimensão transcendental representa o contato com o supramental, a linguagem simbólica, o invisível, ou o mundo espiritual de onde todos viemos e para onde todos retornamos de acordo com a Roda da Vida ou o Samsara, tradição filosófica hinduísta do infinito fluxo de renascimentos. O avatar da Era de Peixes, Jesus, o Cristo, deixou a sublime mensagem de amor universal e incondicional pois não existe dualidade na transcendência, todos somos iguais e pertencemos a uma mesma Substância ou Deus.
Ao mesmo tempo invisível e por não pertencer à realidade manifesta do mundo material, o universo pisciano pode também ser objeto das mais perversas ilusões. A começar por este acesso aos arquétipos e espíritos. Como ele é feito? Se é que pode-se dizer que “é feito” ou , de acordo com a hierarquia entrelaçada da física quântica, está acontecendo o tempo todo sem interferência da mente ou da vontade humana, mas nem sempre somos tão perceptivos ou conectados para perceber. Por isto que os “falsos profetas” das mais variadas religiões e filosofias aproveitam-se dos incautos monopolizando “verdades vindas do reino espiritual” que apenas beneficiam a eles mesmos, renegando o amor incondicional que é mais puro arquétipo pisciano, além de demonstrarem uma total falta de ética. Estes usurpadores trabalham com as sombras de Peixes, a ilusão e o escapismo. Fórmulas mágicas para adentrar ao reino dos céus, “queimar” o karma, entrar em contato com o seu sagrado anjo guardião mediante dízimos, práticas duvidosas, surreais ou que inserem uso de substâncias alucinógenas são perfeitas para pessoas despreparadas, depressivas, inseguras ou acomodadas que representam suculentas ovelhas para o abatedouro dos auto-proclamados mestres e gurus. Gostaria de chamar à atenção sobre a questão dos alucinógenos. Todas as substâncias que alteram sensivelmente nossa percepção representam os instrumentos escapistas do signo de Peixes. Temos a plena capacidade de colapsar intensamente todas as possibilidades do inconsciente coletivo ou transcendente durante toda a nossa vida manifestada no plano material. Senão, não acreditaríamos na não dualidade ou no entrelaçamento. Então, por que nos sentimos tão distantes? Porque nos ocupamos quase que exclusivamente dos afazeres do plano material e nos esquecemos do sutil. Alguns pensam que, basta ingerir periodicamente qualquer alucinógeno como o politicamente correto ayahuaska para que a percepção mude de forma tão radical para a maravilhosa conexão com os arquétipos pessoais. Será que é tão simples assim? Ou é mais uma vez a crescente necessidade de automação e imediatismo do ser humano? Alterar o funcionamento do cérebro que colapsa a memória quântica além de todas as ondas de possibilidade do corpo mental com uma substância que os próprios indígenas têm a maior cerimônia e inúmeras restrições para ser usada, irá afetar as sinapses e, com certeza absoluta, a pessoa nunca sairá da toca do coelho de Alice no País das Maravilhas. Em outras palavras, alterar artificialmente o funcionamento do cérebro não é um recurso consciente e seguro para a prática da percepção transcendental. A DMT (dimetiltriptamina) é a substância encontrada no chá ayahuaska, mas também produzida por nossa glândula pineal quando estamos em meditação profunda. 15 minutos diários de meditação profunda proporcionam nossa reconexão com a essência individual chamada mônada quântica, sem o perigo da adição. Quando estamos “acoplados” ao nosso corpo vital e supramental podemos alcançar as portas da percepção, pois vivemos constantemente ao lado destas portas, mas voltamos as costas a elas, temos muito o que fazer com nossas tarefas diárias. É mais fácil apelar para catalizadores que nos empurram diretamente para o escapismo lisérgico. É como a diferença entre a alopatia que nos dá resultados instantâneos, mas superficiais por tratarem apenas dos sintomas e a homeopatia, que demanda tempo e paciência para a cura real e profunda.
O Arcano Maior 18, A Lua, é a representação arquetípica do caminho da Árvore da Vida que parte da esfera da Terra em direção à esfera do Sentimento. É paralelo ao Aeon, do outro lado do pilar central. O desafio agora não são mudanças de padrões e quebras de condicionamentos. Não renascemos das cinzas rumo a uma nova filosofia de vida. O caminho da Lua é 100% emocional, psíquico e foge do nosso controle a qualquer tentativa de dedução racional e, pode ser isto que nos leva ao pânico e ao escapismo, pois não estamos acostumados a entrar em contato aberto e regular com as profundezas de nossas emoções, sentimentos e instintos. Mas viemos do Caminho do Sol que nos elucidou e resgatou nossa essência e nossa criança interior adormecida. O Sol é a fonte da lucidez que precisamos para atravessar o abismo entre as duas torres ameaçadoras do arcano. Por isto que, na parte inferior da carta encontramos Kephra, o deus do Sol da Meia-Noite segundo a mitologia egípcia, empurrando o “sol” em direção ao abismo. Este escaravelho costuma proteger seus ovos das intempéries do deserto envolvendo-os em uma massa feita de fezes e areia. Esta espécie de besouro é guiada pela localização de constelações, posições estelares, mesmo na mais completa escuridão e isolamento.
Kephra conduz o Sol, sua criação, por um abismo vigiado por ameaçadores e vorazes chacais e sua deidade correspondente, Anúbis, deus egípcio dos infernos encarregado de julgar e embalsamar os mortos. Por isto que este caminho também remete à consciência corporal, sendo nosso veículo físico apenas um dos corpos de manifestação que um dia voltará para a Terra, misturando-se e combinando-se com outros átomos e moléculas de onde saiu. Morte e ressurreição estão aí simbolizados, pois a semente solar, a mônada quântica trazida por Kephra irá nascer e enfrentar as ilusões, os medos, os desafios até sua morte, simbolizada pela lua minguante na parte superior da carta.
As formas espelhadas de Anúbis nos dois lados da carta carregam em sua mão esquerda a chave para percorrer este caminho em segurança: Mercúrio. Aí está uma grande revelação hermética, afinal estamos falando de um caminho simbólico e inconsciente e, Mercúrio é o astro que rege o signo oposto a Peixes, Virgem. A mensagem quântica ou hermética de Crowley nesta carta é o fim das divisões e das dualidades como reconhecimento de que fazemos parte de uma única consciência. Unindo os arquétipos de Peixes e Virgem estaremos inserindo o recurso do nosso intelecto superior unido a nossa intuição e vencendo os fantasmas, medos e ilusões criados pelas nossas sombras ou traumas adquiridos pelos nossos ciclos de morte e renascimento no mundo material.
“Quaisquer que sejam os horrores que afligem a alma, quaisquer que sejam as abominações que provocam repugnância no coração, quaisquer que sejam os terrores que possam agredir a mente, a resposta é a mesma em todas as etapas: como é esplêndida a aventura!” Aleister Crowley
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