Escorpião e a Pulsão de Morte

 

Em março deste ano, a decisão do ator Alain Delon em praticar o suicídio assistido causou várias reações antagônicas. O suicídio é comumente considerado como algo errado e, em muitas religiões é visto como uma atitude passível de castigos eternos.


O suicídio assistido é permitido em alguns países, além da Suíça, e deve ser feito pelo próprio autor pela ingestão de uma substância letal, acompanhado por familiares e profissionais de saúde em clínicas especializadas. O processo para requerê-lo é longo e deve ser comprovada a consciência plena do requerente, além de seu estado de sofrimento físico extremo.


Alain Delon é mais conhecido pelo seu trabalho no cinema francês do que pela sua vida conturbada, sempre enfrentando perdas e morte. Na sua infância, após o divórcio dos pais, é adotado por um casal que foi assassinado. Antes de sua carreira como ator, foi fuzileiro naval e serviu na Indochina, onde ficou na prisão por 11 meses. Desistiu da carreira de ator em 1997 alegando profunda decepção diante dos caminhos do cinema francês, mas retornou em 2008. Entrou em depressão e tentou cometer suicídio por volta de 2001. Em 2019 teve um AVC.


Escorpião representa o arquétipo da destruição, da transmutação para dar ensejo ao novo. A morte nada mais é do que uma forma de transmutar, de mudar. Alain Delon tem o Sol em Escorpião e vivenciou mudanças, destruição, perdas e morte em sua vida, ou seja, sua alma aproximou-se do mais puro significado escorpiônico. Obviamente, isto não é assim para todos os nativos do signo de Escorpião mesmo que, em algum momento de sua vida tiveram a experiência do desapego. O ator também nasceu durante uma quadratura exata entre Plutão em Câncer e Mercúrio em Libra. Lembrando que Plutão é regente de Escorpião, a geração que nasceu com este astro transitando em Câncer vivenciou algumas das maiores catástrofes da Humanidade: a Segunda Guerra Mundial. Por si só e, em algum momento deste trânsito, Plutão em Câncer representou a aniquilação de muitas famílias e até de países, trazendo novas concepções sobre o núcleo familiar. A partir daí, principalmente na Europa, a mulher começou a entrar no mercado de trabalho simplesmente pela perda do marido ou do pai.


Desta forma, a convivência com a morte, as mudanças e a destruição não é algo evitável ou estapafúrdio, mas faz parte da vida. A psicanálise de Freud distingue a pulsão de vida e a pulsão de morte conforme a conservação, sobrevivência ao lado da destruição e da perda. Ambas pulsões encontram-se no eixo complementar dos signos de Touro (pulsão de vida) e Escorpião (pulsão da morte). Interessante observar que Freud tinha este eixo entre seu Sol em Touro e seu ascendente em Escorpião.


A pulsão de morte está presente na decisão do ator não apenas em seu Sol escorpiônico, mas em outros dois fatores: pertencer à geração de Plutão em Câncer e o aspecto mencionado acima, ou seja, a quadratura entre Plutão e Mercúrio. Este aspecto condiz com a constante reciclagem ou desapego de certezas ou conceitos o que, para muitos, pode significar incompletudes na carreira, casamentos, buscas e por aí vai. No entanto, trata-se de uma singularidade no mapa de Delon que desafia a rigidez conceitual ou intelectual. Em outras palavras, este aspecto permite ir cada vez mais fundo nos próprios pensamentos, desvencilhando-se de qualquer estereótipo filosófico, social ou linguístico.


Por mais que seja difícil para muitas pessoas aceitarem, a busca pelo suicídio assistido reflete a mais alta hierarquia na compreensão tanto da pulsão de morte quanto da transmutação do arquétipo de Escorpião. Lutar contra isto não significa pulsão de vida, pois o indivíduo não quer mais conservar, manter, procriar ou realizar qualquer busca neste sentido. O que costumamos perceber em uma grande parte de indivíduos é um antagonismo entre as duas pulsões, mas sem integridade: atitudes destrutivas aliadas ao acúmulo de protetivos materiais.


Além do mais, Delon encontra-se sob um aspecto que poucos indivíduos com idade avançada vivenciam: Plutão em trânsito por Capricórnio realiza uma oposição ao seu Plutão natal e, consequentemente, repete a quadratura a Mercúrio, como se fosse um “espelho”. Portanto, ele revive conteúdos psíquicos, perdas, destruições em seu íntimo. A diferença é a sincronicidade operada por outro astro que muda o tom. Urano em Touro opõe-se ao seu Sol demonstrando que, no fundo, trata-se de uma “pulsão de liberdade” neste momento de vida do ator.


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